Causidicus
2004-03-30
 
A entrevista do Juíz (2)

O Causidicus tem o grato prazer de atribuir ao Juíz Dr. Rui Teixeira os prémios “A escola do CEJ no seu melhor” e “Verá V. Exa. as surpresas que a vida lhe reserva”, como modesto reconhecimento dos méritos da seguinte resposta:

Refere-se aos advogados, como os vê?
Sei precisamente, em cada processo e em cada momento, o que um advogado quer.”
.


A entrevista do Juíz (1)

Depois das campanhas mediáticas de que foi alvo, não serei eu a negar ao Juíz Dr. Rui Teixeira legitimidade para dar a entrevista que deu, na altura em que o fez.

Em todo o caso, neste processo em que “ninguém se soube comportar” e em que os exemplos a seguir não abundam, teria preferido que o Dr. Rui Teixeira mantivesse, até ao final do processo, a exemplar atitude que vinha assumindo e que as suas próprias palavras tão bem descrevem:

“Se os meus despachos não são suficientemente esclarecedores sobre aquilo que se passa são maus. Como tento ser o mais esclarecedor possível, não tenho mais nada a acrescentar. As atitudes que outras pessoas tomaram ficarão com elas. Não me cabe a mim sancionar algumas profissões que estão envolvidas neste processo e que têm órgãos competentes para os representar. Quanto a vir a terreiro falar sobre alguns assuntos, só iria acicatar os ânimos e contribuir para a desinformação geral.”.
2004-03-28
 
40º. Poema de Domingo:


En la doliente soledad del domingo


Aquí estoy,
desnuda,
sobre las sábanas solitarias
de esta cama donde te deseo.

Veo mi cuerpo,
liso y rosado en el espejo,
mi cuerpo
que fue ávido territorio de tus besos,
este cuerpo lleno de recuerdos
de tu desbordada pasión
sobre el que peleaste sudorosas batallas
en largas noches de quejidos y risas
y ruidos de mis cuevas interiores.

Veo mis pechos
que acomodabas sonriendo
en la palma de tu mano,
que apretabas como pájaros pequeños
en tus jaulas de cinco barrotes,
mientras una flor se me encendía
y paraba su dura corola
contra tu carne dulce.

Veo mis piernas,
largas y lentas conocedoras de tus caricias,
que giraban rápidas y nerviosas sobre sus goznes
para abrirte el sendero de la perdición
hacia mi mismo centro
y la suave vegetación del monte
donde urdiste sordos combates
coronados de gozo,
anunciados por descargas de fusilerías
y truenos primitivos.

Me veo y no me estoy viendo,
es un espejo de vos el que se extiende doliente
sobre esta soledad de domingo,
un espejo rosado,
un molde hueco buscando su otro hemisferio.

Llueve copiosamente
sobre mi cara
y sólo pienso en tu lejano amor
mientras cobijo
con todas mis fuerzas,
la esperanza.


Gioconda Belli.
2004-03-21
 
Poema de Domingo:


Les bonbons

Je vous ai apporté des bonbons
Parce que les fleurs ça est périssable
Puis les bonbons c'est tellement bon
Bien que les fleurs soient plus présentables
Surtout quand elles sont en boutons
Mais je vous ai apporté des bonbons

J'espère qu'on pourra se promener
Que Madame votre mère ne dira rien
On ira voir passer les trains
A huit heures moi je vous ramènerai
Quel beau dimanche allez pour la saison
Je vous ai apporté des bonbons

Si vous saviez ce que je suis fier
De vous voir pendue à mon bras
Les gens me regardent de travers
Y en a même qui rient derrière moi
Le monde est plein de polissons
Je vous ai apporté des bonbons

Oh! oui! Germaine est moins bien que vous
Oh oui! Germaine elle est moins belle
C'est vrai que Germaine a des cheveux roux
C'est vrai que Germaine elle est cruelle
Ça vous avez mille fois raison
Je vous ai apporté des bonbons

Et nous voilà sur la grand'place
Sur le kiosque on joue Mozart
Mais dites-moi que ça est par hasard
Qu'il y a là votre ami Léon
Si vous voulez que je cède la place
J'avais apporté de bonbons...

Mais bonjour Mademoiselle Germaine
Je vous ai apporté des bonbons
Parce que les fleurs ça est périssable
Puis les bonbons c'est tellement bon
Bien que les fleurs soient plus présentables
Surtout quand elles sont en boutons
Mais je vous ai apporté des bonbons.


Jacques Brel, 1964.


BLOGS HÁ MUITOS…

O excelente Cruzes Canhoto! agora está aqui.

Mais dois blogs dedicados a Clio: O Fio de Ariana e O Livro das Horas.

Agradeço os simpáticos links dos blogs: A Formiga de Langton (cujo regresso saúdo entusiasticamente), Galo Verde, Senhor Vertigem e Velho Blog de Publicidade.
2004-03-11
 
Como o escriba residente se vai ausentar por alguns dias, aqui fica, em avanço, o poema do próximo Domingo:


MALICE

On dit
que la robe des robes partout se pose et se repose,
que la toilette est aux yeux du dimanche,
que le repos suit la pente des bras.
Toilette fine pour visites,
propreté chez les autres,
robe de tenue droite avec un paquet.
Robe mise, porte ouverte;
robe ôtée, porte fermée.

Paul Éluard Les nécessités de la vie et les conséquences des rêves.


As pedras de Roseta e o Ministério Público

Recentemente muitos se indignaram, justamente, com a tibieza com que a GNR reagiu à arruaça protagonizada por um autarca, durante um desafio de futebol. Afirmou-se que apenas a subserviência das autoridades perante o cacique local poderia justificar tal comportamento.

Convém lembrar, porém, que a subserviência face a estes sobas não é exclusivo de autoridades locais, manifestando-se a altos níveis de responsabilidade da administração central, que preferem, muitas vezes, ignorar os deveres que a Lei lhe impõe, quando eles colidem com os interesses ou o peso político de um qualquer Sr. Joãozinho das Perdizes, Presidente de Câmara Municipal.

O domínio do património cultural é daqueles em que este problema se tem posto com maior acuidade. A harmonização dos valores do progresso com os da protecção do património nem sempre é fácil, é quase sempre onerosa e implica demoras e limitações diversas. Os próprios poderes públicos procuram muitas vezes, nos seus empreendimentos, contornar as obrigações legais nesta matéria. Delapidações e atentados ao património cultural, mesmo se classificado, praticadas pela administração central ou local, são por demais conhecidas. Muitos valores patrimoniais não passam, para estes empreendedores públicos, de meras “pedras”, que a insensatez do legislador atravessou no seu caminho.

E o que fazem os Institutos na dependência do Ministro Pedro Roseta, aos quais o Estado deferiu a tutela do património cultural? Aos simples particulares e às instituições (públicas ou privadas) bem comportadas, com cultura e tradição de respeito pela legislação do património cultural, aplicam todo o rigor da lei, devidamente temperado pelo peso da burocracia, quando não enfeitado por extravagâncias e caprichos da sua exclusiva lavra. Porém, quando se trata de autarcas com peso político e que não têm pejo em ignorar as imposições legais que não lhes convêm ou as competências dos ditos Institutos, a conversa é outra.

Não raro, a comunicação social relata casos de obras promovidas ou licenciadas por Câmaras Municipais, sem que tenham sido obtidos os pareceres da administração do património cultural legalmente exigidos, ou que estarão a violar pareceres vinculativos emitidos. Sucedem-se igualmente os relatos de obras realizadas sem observância das exigências legais relativas à minimização de impactes, designadamente no que se refere ao acompanhamento e registo arqueológico. Não vale a pena – nem é objecto deste post – referir aqui qualquer caso particular. A realidade acima descrita é pública e notória.

Quando estas ilegalidades - que põem em causa um património não renovável que é de todos, muitas delas indiciando condutas tipificadas como crime (no Código Penal ou na LPC) – são praticadas pelos tais autarcas politicamente influentes, verifica-se por vezes uma pasmosa não-reacção por parte dos Institutos do Ministério da Cultura. Providências administrativas da sua competência ou o recurso aos mecanismos judiciais que a Lei prevê parecem ficar no esquecimento, como se não existissem, limitando-se os responsáveis a alertar, timidamente, para as ilegalidades praticadas ou em curso...

Enredados em processos de reorganização permanentemente adiados (e de bondade muito discutível), limitados nos recursos, carentes da aprovação da legislação de desenvolvimento da LPC, cada vez menos os Institutos do MC parecem estar à altura de cumprir as suas responsabilidades face aos atentados às “pedras” que confiámos a Roseta.

Quando esta tibieza se manifesta e as ilegalidades praticadas são amplamente divulgadas na comunicação social, resta-nos confiar na intervenção de Magistrados, que não se coibam de enfrentar os caciques e outros poderosos, se a defesa da legalidade o exigir.

O Ministério Público tem competências e um papel insubstituível a desempenhar na defesa dos interesses difusos e importa que o comece a exercer com maior ênfase no domínio do património cultural.

Sem prejuízo de vários casos conhecidos em que o MP tomou a iniciativa de promover processos administrativos ou criminais em defesa do património cultural, por vezes com base em notícias na imprensa (cf., por ex., a R.M.P., n. 49, pp.161-163), tenho a sensação – eventualmente desajustada - de que esta matéria não tem merecido a atenção que a multiplicação dos casos noticiados justificaria.

A consulta dos Boletins de Interesses Difusos disponibilizados no site da PGR, permite constatar uma notável actividade no âmbito dos direitos dos consumidores ou do direito do ambiente, sendo quase inexistentes as menções à defesa do património cultural.

Talvez os caros Cordoeiros possam esclarecer melhor esta questão, com o especial conhecimento de causa de que dispõem.

Deste Causidicus, ficam os votos de que o MP actue diligentemente contra as ilegalidades cometidas contra as nossas “pedras”, já que outros, a quem tal caberia, por vezes o não fazem.

Registo aliás, que, para além dos procedimentos visando directamente a protecção do património cultural, não deixaria também de aproveitar à prevenção de certas omissões funcionais que as mesmas passassem a ser especificamente investigadas, procedendo-se em conformidade com os factos apurados.


Atentados e hipocrisias multiculturalistas

Ler no Holocénico.


2004-03-11
BASTA!

2004-03-09
 
Aviso aos marinheiros de primeira viagem:

Causidicus é um blog dedicado à Sociedade Aberta, Justiça, Media, Cultura, Património, Ambiente e o mais que lembre.
Foi criado em 2003-06-09 e a sua existência obedece a uma máxima aquiliniana:
“o português resigna-se a tudo menos a não ter opinião ou a não deitar a sua sentença”
(Aquilino Ribeiro, Aldeia – Terra, Gente e Bichos, Bertrand Ed., 1995, p. 90).
Continua a ser um blog unipessoal, sem quaisquer pretensões de frequência ou de programação. Será actualizado quando puder ser, com a temática que na altura calhar.
Este blog é anónimo, mas não se acoberta no anonimato. O autor usa nickname, porque entende que as ideias têm uma valia intrínseca e independente da pessoa que as veicula e porque não quer qualquer tipo de publicidade pessoal ou profissional, ainda que indirecta. Confia porém que usará de prudente critério para não ofender ilegitimamente a honra ou a consideração de quem quer que seja. Se assim não fôr, assegura aos visados o direito de resposta neste blog e disponibilizará a sua cabal identificação aos que a solicitem. Para esse efeito ou outros – comentários, sugestões, ameaças de bengaladas, .... - está disponível o endereço: causidicus@mail.pt.

P.S. – Constando que as iniciais que assinavam os posts poderiam suscitar a atribuição da autoria deste blog a causídicos de todo isentos de tal malfeitoria, foi alterada a assinatura, que passará a ser, simplesmente, Causidicus.
2004-03-08
 
Stella Awards: os tribunais dos EUA no seu melhor...

Os que se queixam da monotonia - ou dos excessos da litigância - nos tribunais portugueses, podem sempre considerar a hipótese de mudar de ambiente, passando a acompanhar a vida judiciária norte-americana. Os EUA brindam-nos todos os anos com novos casos judiciais em que os pedidos e respectivas causas de pedir seriam a priori ridículos ou inacreditáveis (em especial no domínio da responsabilidade civil), mas que... tiveram sucesso. Para “homenagear” os processos judiciais mais improváveis, foram criados os Stella Awards, cuja denominação recorda o caso de Stella Liebeck, uma (então) septuagenária que recebeu uma indemnização de 2,9 milhões de dólares por se ter queimado ao entornar um copo de café num restaurante de uma conhecida cadeia de fast-food.
Não perca os Stella Awards de 2003 (ler aqui)!

(Post inspirado por este artigo – que contém algumas incorrecções: o caso do pretenso vencedor de 2003 é considerado falso no site Stella Awards).


Garantias da Advocacia e "ódios de estimação" (3)

O Carvalhadas-on-line publicou ontem um interessante e bem informado post sobre o objecto deste debate.

2004-03-07
 
Poema de Domingo:


Les Flamandes


Les Flamandes dansent sans rien dire
Sans rien dire aux dimanches sonnants
Les Flamandes dansent sans rien dire
Les Flamandes ça n'est pas causant
Si elles dansent c'est parce qu'elles ont vingt ans
Et qu'à vingt ans il faut se fiancer
Se fiancer pour pouvoir se marier
Et se marier pour avoir des enfants
C'est ce que leur ont dit leurs parents
Le bedeau et même son Eminence
L'archiprêtre qui prêche au couvent
Et c'est pour ça et c'est pour ça qu'elles dansent

Les Flamandes
Les Flamandes
Les Fla
Les Fla
Les Flamandes


Les Flamandes dansent sans frémir
Sans frémir aux dimanches sonnants
Les Flamandes dansent sans frémir
Les Flamandes ça n'est pas frémissant
Si elles dansent c'est parce qu'elles ont trente ans
Et qu'à trente ans il est bon de montrer
Que tout va bien que poussent les enfants
Et le houblon et le blé dans le pré
Elles font la fierté de leurs parents
Et du bedeau et de Son Eminence
L'archiprêtre qui prêche au couvent
Et c'est pour ça et c'est pour ça qu'elles dansent

Les Flamandes
Les Flamandes
Les Fla
Les Fla
Les Flamandes


Les Flamandes dansent sans sourire
Sans sourire aux dimanches sonnants
Les Flamandes dansent sans sourire
Les Flamandes ça n'est pas souriant
Si elles dansent c'est qu'elles ont septante ans
Qu'à septante ans il est bon de montrer
Que tout va bien que poussent les petits-enfants
Et le houblon et le blé dans le pré
Toutes vêtues de noir comme leurs parents
Comme le bedeau et comme son Eminence
L'archiprêtre qui radote au couvent
Elles héritent et c'est pour ça qu'elles dansent

Les Flamandes
Les Flamandes
Les Fla
Les Fla
Les Flamandes


Les Flamandes dansent sans mollir
Sans mollir aux dimanches sonnants
Les Flamandes dansent sans mollir
Les Flamandes ça n'est pas molissant
Si elles dansent c'est parce qu'elles ont cent ans
Et qu'à' cent ans il est bon de montrer
Que tout va bien qu'on a toujours bon pied
Et bon houblon et bon blé dans le pré
Elles s'en vont retrouver leurs parents
Et le bedeau et même Son Eminence
L'archiprêtre qui radote au couvent
Et c'est pour ça qu'une dernière fois elles dansent

Les Flamandes
Les Flamandes
Les Fla
Les Fla
Les Flamandes


Jacques Brel, 1972.


Podem os advogados assumir o pagamento de cauções para libertar clientes?

The ABA's Committee on Ethics and Professional Responsibility stated in its opinion last week that a lawyer's professional judgment could be compromised if he or she fears that a client won't appear in court as scheduled — preventing the lawyer from recouping the bail money paid.

(ler aqui).


Blawgs (3)

A temática abordada no post sobre blawgs continua a merecer simpáticas referências, como esta do ContraFactos & Argumentos. No Quinto dos Impérios (um dos clássicos da nossa blogosfera), FMS apresenta algumas sugestões imperdíveis de títulos para blawgs. Pode ser que alguém se inspire...


Muito obrigado!

Pelos links, aos blogs Ad Libitum, Blasfémias, Blogueio Mental, bem como à galáxia ambiental de Pedro Almeida Vieira: Estrago da Nação, Extractos do Estrago da Nação, Reportagens Ambientais e Ambiente no Mundo.
2004-03-04
 
Um pouco mais de azul

Não posso deixar de recomendar um blog que publica belos poemas e faz juramentos a Clio!


Guantanamo: mais do mesmo.

Anunciam-se mecanismos de “revisão anual” da “necessidade” das detenções, por órgãos inteiramente controlados pela Administração Bush e à revelia de qualquer controlo jurisdicional (ler aqui e aqui).


Garantias da Advocacia e "ódios de estimação" (2)

O debate com alguns Cordoeiros sobre este assunto transitou, animado, para os comentários que aquele blog em boa hora voltou a disponibilizar. É um fórum em que predomina a seriedade intelectual e que pela minha parte (sempre que possível...) já não dispenso.
 
Garantias da Advocacia e "ódios de estimação"

Segundo o “Público” de hoje:
“O bastonário José Miguel Júdice considera "indigno" e "atentatório da liberdade de defesa" que os advogados tenham sido obrigados a ouvir de pé o despacho de pronúncia do megaprocesso de corrupção na Brigada de Trânsito da GNR, anteontem no Tribunal do Monsanto, em Lisboa.
(...)
Reconhecendo as dificuldades logísticas inerentes aos megaprocessos, considera que "já vai sendo altura de os tribunais se prepararem para estes casos" e que "alguém vai ter que tratar disto com a máxima brevidade possível". E conclui: "De certeza que neste julgamento os procuradores do Ministério Público estavam sentados".”
.

O estimável Cordoeiro L. C. leva esta última afirmação à conta de uma manifestação do “odiozinho primário” do Bastonário ao Ministério Público, no título de um post de hoje em que escreve:
“Tem Sua Excelência toda a razão. Só não a tem quando, invariavelmente, dirige a sua saga contra o Ministério Público, como se este fosse o culpado de tudo quanto de mal acontece na administração da justiça. Assevera ele: "De certeza que neste julgamento os procuradores do Ministério Público estavam sentados".
E os juízes? Estavam de cócoras?”
.

Este post está a ser muito aplaudido pelos habituais comentadores afectos ao MP, não obstante ser, a meu ver, de todo escusado e infeliz.

Duas notas prévias se impõem porém.

Uma primeira, para registar o óbvio. O Causidicus não tem procuração do Bastonário para defender a sua tese e já aqui expressou, mais do que uma vez, críticas à actuação da OA em larga medida coincidentes com as de alguns Cordoeiros.

A segunda para realçar o grande mérito substancial d’ Os Cordoeiros: a criação de um fórum de discussão animado essencialmente por Magistrados mas que, com lucidez e equilíbrio, não se tem furtado à crítica às magistraturas, contrariando a tendência dominante nas corporações judiciárias para criticar exclusivamente os demais operadores.

Desta vez, porém, creio que L. C., reconhecendo embora razão ao Bastonário, acabou por revelar uma sensibilidade epidérmica desmesurada à referência deste à sua magistratura, “enfiando uma carapuça” que ninguém lhe terá querido enfiar.

Não vejo que o Bastonário tenha dirigido, nas declarações em apreço, qualquer crítica ao MP. Criticou, sim, a administração da justiça que não cuida da logística inerente aos megaprocessos, ignorando designadamente as condições de trabalho e de dignidade compatíveis com o estatuto de colaboradores na administração da justiça que a lei confere aos Advogados responsáveis pela defesa dos arguidos. A comparação com as condições asseguradas aos Magistrados do Ministério Público não parece poder ser entendida como uma crítica aquela magistratura, constituindo, apenas, tal como a entendo, o registo de (mais) uma situação factual em que o princípio da “igualdade de armas” foi indevidamente postergado, juntamente com o respeito exigível pelo papel do Defensor. Daí que se justificasse uma referência ao MP, não se justificando qualquer referência aos Magistrados judiciais. E todos sabemos a frequência com que os Advogados se vêm confrontados com condições de trabalho impróprias nas nossas salas de audiência, cuja subsistência não seria tolerada caso fossem igualmente impostas aos Magistrados.

Não é, objectivamente, aceitável que o Defensor de um arguido – em qualquer processo e em particular num “megaprocesso” – seja sujeito a acompanhar de pé os trâmites de uma diligência. Os Exms. Magistrados – Judiciais e do Ministério Público – i ntervenientes no processo, a quem cabem especiais deveres de defesa da legalidade, deveriam ser os primeiros a suscitar a suspensão da diligência até estarem criadas as condições mínimas indispensáveis ao regular funcionamento do Tribunal.

Pelos vistos anda esquecido e carece de ser recordado o artº. 58º. do EOA:
“ARTIGO 58º
Das garantias em geral
l. Os magistrados, agentes de autoridade e funcionários públicos devem assegurar aos advogados, quando do exercicio da sua profissão, tratamento compatível com a dignidade da advocacia e condições adequadas para o cabal desempenho do mandato.
2. Nas audiências de julgamento, os advogados dispõem de bancada própria e podem falar sentados.”
.

O autor destas linhas, por deveres de ofício e pelo respeito que a toga lhe merece, nunca aceitaria assistir de pé a uma diligência e não deixaria de recorrer a todos os meios que a lei lhe confere para repôr a legalidade.

Seria preferível que os Exms. Magistrados se associassem a esta preocupação, pugnando pelas garantias da boa administração da Justiça, em vez de manifestarem escusadas susceptibilidades (ou se afadigarem em comentários de gosto duvidoso...).

Além de que, como referi num post publicado no primeiro dia deste Causidicus, convém ter presente a máxima de Calamandrei segundo a qual: "beca e toga obedecem à lei dos líquidos em vasos comunicantes: não se pode baixar o nível de um, sem baixar igualmente o nível do outro". A continuarmos nesta senda, qualquer dia, prezado L. C., até a sua bancada e cadeira podem estar em risco...
2004-03-01
 
BLASFÉMIAS: A FUSÃO DO ANO NA BLOGOSFERA!

A má notícia: Três dos melhores blogs lusos terminaram abruptamente (não, não foi esse...). Os finados Cataláxia, Cidadão Livre e Mata-Mouros têm lugar cativo na história da nossa recente blogosfera.
A boa notícia: Os seus autores juntaram esforços num novo blog. Ainda 2004 vai no começo mas desconfio que esta será a fusão bloguística do ano ou, pelo menos, uma séria candidata a esse título. Deve ser a retoma.

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